• Gabriel Medeiros – Arcabouço fiscal: As novas soluções com os velhos problemas

    Gabriel Medeiros, colunista de economia da Folha de Barbacena comenta sobre o projeto enviado ao congresso sobre o Arcabouço Fiscal

    *Por Gabriel MedeirosColunista de Economia da Folha de Barbacena

    ITACI BATISTA/AE/AE/

    O P I N I Ã O

    Depois de uma espera dramática ao melhor estilo de novela mexicana, finalmente o governo enviou ao congresso o projeto de lei complementar 93/2023 que se refere ao já conhecido “Arcabouço Fiscal”.

    Na semana em que o Ministro da Fazenda fez uma apresentação geral sobre o projeto, eu escrevi uma coluna aqui no Folha comentando sobre o assunto, você pode conferi-la clicando aqui. Porém, agora não se trata mais de rumores, mas sim o projeto final que trouxe consigo algumas modificações em relação ao que tinha sido apresentado no Power Point de semanas atrás. Mas será que as mudanças foram suficientes para tornar o projeto mais efetivo e/ou mais fácil de ser aprovado?

    Em linhas gerais, o projeto manteve as principais regras de contenção de despesas que eu já havia mencionado da última vez (limite de aumento de gastos em 70% do crescimento da receita, intervalo mínimo e máximo de aumento entre 0,6% e 2,5% do PIB). Porém, a ideia que Haddad havia apresentado na entrevista de semanas atrás estabelecia que o governo teria uma meta de quanto precisaria arrecadar acima dos seus próprios gastos para evitar o aumento da dívida pública e que, se conseguisse superar esse objetivo, poderia utilizar todo o dinheiro que sobrasse para investimentos públicos. Já na proposta apresentada, existe uma limitação do uso dessa “sobra” em no máximo 25 bilhões de reais.

    Contudo, se no rascunho que foi apresentado pelo Ministro anteriormente já havia brechas que permitiam que a União não seguisse a limitação dos gastos em algumas áreas, agora parece que as exceções são maiores que as próprias regras. Isso porque o projeto apresentado essa semana conta com 13 tipos de despesas que não entrarão no rigor do Arcabouço Fiscal. Ou seja, se antes já havia dúvidas sobre como o governo conseguiria entregar o resultado que prometeu, agora essa missão parece ainda mais difícil e mais dependente da geração de novas receitas.

    Mas se o Ministro Fernando Haddad vai precisar de mais dinheiro para conseguir cumprir seu plano, a pergunta que vem em seguida é: de onde virá esse recurso? A resposta mais óbvia para esta pergunta seria a criação de novos impostos, mas o governo diz que não tem interesse em usar essa medida.

    Uma segunda possiblidade (que é defendida por Haddad) seria a revisão de benefícios fiscais que são isenções parciais ou totais de determinados impostos oferecidos pelo governo a empresas por algum motivo de interesse do país (um grande exemplo disso são as isenções oferecidas a empresas que se instalam na Zona Franca de Manaus). É fato que somente no ano que vem, existe a previsão de um custo de mais de 480 bilhões em incentivos fiscais e que parte desse valor é questionado por muitos especialistas. Porém, recentemente acompanhamos o Ministro ser derrotado e voltar atrás em uma discussão sobre isenção de impostos de importação de produtos chineses de até US$ 50, seria ele então capaz de convencer deputados a votarem projetos sobre um tema bem mais delicado que prejudica grandes empresas com forte influência política?

    Por fim, uma terceira possibilidade tem a ver com o custo inflacionário. Para entender melhor essa opção, pense no seguinte exemplo: um caminhoneiro que transporta alimentos precisa abastecer o seu caminhão com diesel e assim como qualquer outro produto, existe a cobrança de impostos que acontece da seguinte forma:

    • O caminhoneiro paga R$ 4,00 no litro de diesel
    • O governo cobra 20% de impostos = R$ 0,80

    Agora imagine que por conta da inflação, o preço do diesel sobe de R$ 4,00 para R$ 6,00.Teremos o seguinte cenário

    • O caminhoneiro paga R$ 6,00 no litro de diesel
    • O governo cobra 20% de impostos = R$ 1,20

    Veja que, por conta da inflação, a arrecadação de impostos sobre o litro de diesel aumentou em 50% para o governo. Isso sem contar que como o caminhoneiro do exemplo transporta alimentos, o custo do aumento do combustível provavelmente vai ser repassado para os alimentos, o que gera ainda mais inflação e mais arrecadação. Dessa forma, pode haver um interesse por parte do Estado em permitir uma inflação mais alta no país, o que apesar de parecer resolver o problema, prejudica diretamente a população, em especial os mais pobres.

    Em resumo, a versão final da proposta de Haddad parece trazer mais perguntas do que respostas. É claro que o projeto pode ser profundamente modificado pelo Congresso, mas não é possível dizer se isso será positivo ou negativo e nem se será aplicável, até porque viemos de uma história recente onde atual “teto de gastos” do governo Temer acabou cedendo antes mesmo de chegar a metade do seu prazo de vigência. Por ora, seguimos acompanhando.

    *As opiniões de nossos colunistas não necessariamente refletem a opinião da Folha de Barbacena

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