• Trem de doido

    Por Marcos Faria

    Houve uma época em que a loucura não era tida como algo fora do normal, não era sequer taxada como uma anomalia, pelo menos não como uma a ser segregada.

    Aqueles que ouviam vozes poderiam na verdade apenas ter o dom de se comunicar com os deuses, ou mesmo quando não falassem coisa com coisa, estavam na verdade expressando uma linguagem enigmática e superior. Eram chamados de oráculos, adivinhos, sábios, bruxos, etc.

    Contudo, quando o ato de pensar teve regras decretadas com o surgimento da lógica, aqueles que não puderam de adaptar, passaram a ser marginalizados. Aquele que outrora era tido como um “adivinho”, avatar, etc. perdeu seu caráter místico e passou a ser simplesmente “louco” ou no pior dos casos, um “mal” a ser extirpado.

    Não é à toa que dado momento da sociedade humana criou-se lugares para aprisioná-los ao ponto que não só mais os tidos “loucos” fossem marginalizados como qualquer outro tipo de indivíduo que quebrasse as regras da sociedade e sua tão pavorosa expressão da “moral e bons costumes” tão rotineiramente usada para punir, censurar ou condenar aquilo que muitas vezes é apenas diferente.

    Mulheres que se tornavam mães solteiras e consequentemente uma vergonha para a família eram despachadas também para o mesmo lugar que esses sujeitos que não se enquadravam às regras cognitivas da sociedade, por exemplo.

    Daí a expressão trem de doido, vagões abarrotados de indivíduos que a sociedade queria esconder debaixo do tapete, eram deixados em minha terra, Barbacena. Que por sua vez passou a conflitar a fama de “Cidade das rosas” com uma de “terra de loucos”.

    Filósofos propuseram muitos questionamentos sobre razão e loucura, muita luta se teve para rever nossos conceitos enquanto sociedade em relação aos “loucos” e hoje muitas das coisas que foram feitas em relação a esse assunto passaram a ser felizmente consideradas desumanas.

    Não seria a loucura um pouco essencial ao ser humano? Se olharmos para grandes pensadores e artistas encontraremos um pouco de loucura em suas histórias e produções. Tanto que Filosofia é considerado coisa de doido. Cientistas são retratados como malucos no senso comum, artistas então, nem se fala.

    O que há de comum nessas esferas é que todas elas são essenciais para a evolução e existência humana, mas contraditoriamente são tendenciosamente vistas como loucura, ou seja, como aquilo que foge de uma concepção ilusória do que é normal.

    Então, a loucura na verdade não só faz parte do ser humano, como é essencial para sua realização…

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