• Sentimento de incompreensão

    Por Rogério Puiatti

    Quando você se sente incompreendido é como se você estivesse andando sobre pedras pontiagudas em um local cercado por espinhos, sem absolutamente ninguém, somente os espinhos e você. Você tenta primeiramente se comunicar com seu EU e, após diversas tentativas frustradas e sem sucesso, você se convence que o problema é com você. Você tenta se abrir, comunica com o próximo, diz exatamente tudo que disse para o seu EU repetidas vezes, sem parar, dia após dia, incansáveis vezes. Você termina de falar e espera uma resposta, um som, um A. Você não recebe o que esperava ouvir e mais uma vez você se sente frustrado e começa novamente a pensar que o problema é com você. Que o erro é você, que você está no lugar errado por tantos anos. Você começa a duvidar de você e se convence que esse mundo não é seu lar. Você se fecha mais e mais. Você não consegue mais se comunicar, sorrir, viver. Você se isola. Você se torna uma pessoa fria, não somente por sua causa, mas por causa de todo o contexto, de todos ao seu entorno. Você dorme e sonha com um mundo lindo onde você é feliz por ser simplesmente você. Daí você acorda, abre os olhos e percebe que aquilo só era mais um sonho, que junto com os milhares estão guardados no fundo do quarto preto do seu subconsciente. Você levanta, olha no espelho e percebe novamente que este ambiente não é sua morada. Você troca de roupa, vai na cozinha, senta e começa a tomar seu café da manhã. A cada gole forçado que você empurra goela abaixo simplesmente para não “morrer de fome” mesmo sentindo que já está morto e que aquele café não irá mudar nada na sua vida. Você não sente mais fome e simplesmente come por comer. Você levanta, lava seu copo e tenta ler. Você abre o livro e aquela sensação gostosa que você tinha anos atrás simplesmente não existe mais. São só personagens sem graça. A magia se foi. Você não consegue ler e abandona o livro. Você decide assistir uma série, das suas preferidas. Aperta o play. Você não sente nada. O romance entre os personagens não te toca. Você se sente frio e vazio. Você vê aquela cena e sente nojo e coloca em uma série de terror. Você observa as mortes, os gritos, o sangue, o sofrimento e percebe que tudo aquilo não tem sentido pois não é real. São só corpos e mais corpos, sangue e mais sangue, morte e mais morte e você para e começa a imaginar que aquilo, aquele sofrimento, aquele fim seria o seu e começa a gostar da ideia. Como eu faço para parar de sentir e como eu faço para voltar a sentir? Eu só quero sentir e ao mesmo tempo deixar de sentir. Essa dor silenciosa me consome, me corrói como ácido, me machuca, me mata lentamente. Você desliga a tv e coloca uma música agitada. Você não tem paciência para ela e decide colocar uma mais calma. Você começa a chorar e chora tanto que parece que um lago se formou no seu quarto. Como eu consegui guardar isso tudo por tanto tempo? A noite chega. Você arruma sua cama e deita. O sono vem e você sonha novamente com um mundo mágico, onde você pode ser você, onde você é feliz, onde não existe dor. Você acorda e percebe que aquele ciclo começou novamente e você tenta suportar e aguentar por mais alguns dias, meses, anos. Você está fraco, seu corpo está fraco, sua mente está fraca. O seu eu zumbi continua aqui. O vírus da autodepreciação está aqui. Você não aguenta mais. Você quer desistir. Você só queria morar dentro do seu sonho. Você fecha os olhos e torce para nunca mais abri-los. Você sonha e agora você sonha eternamente.

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