• Economia com Gabriel Medeiros – Presidente Lula propõe Lei para regulamentar Motoristas de Aplicativo: um avanço ou um retrocesso?

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    Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

    O presidente Lula assinou nessa semana um projeto de Lei que visa regulamentar o trabalho de motorista de aplicativo. A ideia por trás de uma regulamentação é que a profissão se torne reconhecida por lei e preveja direitos e deveres do trabalhador, bem como formaliza a relação entre o motorista e a plataforma (Uber, 99, entre outras). Porém, o projeto está apenas no início da tramitação para se tornar lei e pode ser modificado ou rejeitado ao longo do caminho.

    Contudo, algumas regras previstas pelo projeto já existem na prática, o que nos leva a perguntar se de fato ele vai melhorar a condição de trabalho dos motoristas bem como qual seria a intenção por trás do projeto. Mas antes, vamos entender quais são as mudanças propostas.

    O projeto prevê um piso mínimo de R$ 32,09 por hora de trabalho, ou uma remuneração mínima de um salário-mínimo (R$ 1.412) desde que o motorista trabalhe 8 horas diárias. Além disso, o texto estabelece que o trabalhador não pode ultrapassar 12 horas diárias na mesma plataforma.

    Em seguida, o projeto classifica os motoristas como “trabalhadores autônomos por plataforma” e estabelece que estes contribuam com 7,5% da sua remuneração para o INSS, enquanto a plataforma contribui com 20%. A nova lei definiria como remuneração a parcela equivalente a 25% da receita bruta que o motorista fizer nos aplicativos (dado que os outros 75% seriam entendidos como despesas de manutenção, combustível, etc). E com a contribuição, o benefício de auxílio-maternidade seria oferecido.

    Por fim, seria criada a possibilidade da existência de sindicatos que negociariam as condições entre motoristas e plataformas.

    O que as alterações de fato mudam?

    É preciso olhar com cuidado para toda essa história, pois, apesar das notícias mostrarem que o projeto cria uma série de regras para proteger o trabalhador, na verdade algumas delas já existem.

    Em primeiro lugar, podemos citar o limite diário de 12 horas que já é adotado em plataformas como a Uber e outras que fazem com que o motorista fique impedido de se conectar após atingido o limite.

    Além disso, a formalização do trabalhador que aconteceria por meio do recolhimento do INSS a fim de obter benefícios da previdência também já é uma possibilidade desde 2019, ano em que se tornou possível para o motorista prestar seus serviços como Microeemprendedor Individual – MEI, adquirindo seu próprio CNPJ e recolhendo suas contribuições.

    Vale destacar que, com o projeto de lei proposto, as contribuições de motorista e plataforma somadas atingem um patamar de 27,5% sobre a remuneração, enquanto como MEI elas são equivalentes a 5% de um salário-mínimo. Ou seja, dependendo do lucro do motorista, a contribuição do INSS pode ser bem mais alta com a nova legislação.

    E no que diz respeito à sindicalização da profissão, também é valido dizer que já existem associações estaduais e regionais que atuam como representantes da classe, logo, não seria necessário a criação de um sindicato, bastando apenas fortalecer as instituições já existentes. Estas inclusive que podem ter mais flexibilidade e permitir uma voz mais ativa por parte do motorista do que sindicatos tradicionais.

    Por fim, o ponto da lei que fala sobre o “salário-mínimo” dos motoristas a princípio parece muito positivo por garantir um mínimo de dignidade para esses profissionais que enfrentam longas jornadas de trabalho para conseguirem pagar suas próprias contas. No entanto, esse mínimo está condicionado a uma jornada de trabalho diária de 8 horas o que faz com que não somente o motorista perca a sua flexibilidade de trabalho, como também exclui muitos trabalhadores desse benefício, uma vez que segundo o IBGE, 47,8% dos motoristas não têm as plataformas de transporte como fonte de renda principal, portanto, não poderiam cumprir a carga horária.

    Possíveis interesses

    Até aqui falamos da ótica do motorista com relação as possíveis mudanças, no entanto, existe o outro lado da história no qual participam as plataformas de transporte. Estas enfrentam hoje inúmeros processos trabalhistas na justiça que buscam em grande parte criar um vínculo empregatício entre o motorista e a plataforma fazendo com que esta seja obrigada a pagar benefícios trabalhistas para o motorista (como FGTS, INSS, etc).

    Grande parte desses processos são possíveis porque não há uma regulamentação específica para a profissão no Brasil que determine exatamente qual é o vínculo que existe entre motorista e plataforma. Logo, uma lei que defina normas e regras ajuda a dar previsibilidade para a plataforma e evita que ela seja acionada na justiça com tanta frequência.

    Mas então, a regulação deve acontecer?

    É importante que a profissão seja regulamentada de forma a estabelecer limites e garantias para os motoristas, bem como dar previsibilidade jurídica que evite o acúmulo dos processos na justiça. Mas esta regulamentação precisa propor soluções para os problemas existentes sem que isso gere aumento de custos para os motoristas ou até mesmo um aumento da tarifa de transporte que possa inviabilizar a existência dos aplicativos.

    Talvez uma legislação que reforçasse os recursos já existentes (como a possiblidade do MEI e a criação de associações de classe) e que se preocupasse em formalizar as relações entre motorista e plataforma a fim de evitar dúvidas e processos poderia ser mais efetiva e talvez mais simples de ser aprovada pelo congresso.

    No entanto, o governo optou por seguir o caminho da regulação total, o que faz com que ele fique sujeito a eventuais mudanças e reprovações do congresso, de modo que não há como se ter ideia de como estará esse projeto de lei ao final do processo.

    Mas enquanto o final não chega, seguimos acompanhando as próximas atualizações!

    *As opiniões de nossos colunistas não necessariamente refletem a opinião da Folha de Barbacena

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