Em meio a retrocessos, Lei Antimanicomial completa 20 anos em 2021
Um estudo divulgado pela organização não-governamental Desinstitute denuncia diversos problemas do setor da Saúde Mental
Há exatos 20 anos, o Brasil se tornou o primeiro país da América Latina a adotar uma Política Nacional de Saúde Mental. A criação da lei federal que assegurava direitos de pacientes com transtornos psiquiátricos representou um marco para a região, com um texto que surgiu após pressões de um movimento que começou ainda na década de 1970.
Conhecida como Lei Antimanicomial, sua criação surgiu após denúncias de violações dos direitos humanos nos ambientes de internação, como no caso do Hospital Colônia de Barbacena, criado em 1903. A proposta visava, principalmente, o combate a internação compulsória como meio de lidar com essas pessoas.
A tramitação do texto no Congresso durou mais de dez anos e a promulgação representou uma grande mudança na cultura do país, fazendo com que seja necessário que os pacientes concordem com o processo, que só pode ser feito de maneira involuntária e compulsória em situação de emergência ou por determinação da justiça.
Um estudo divulgado pela organização não-governamental Desinstitute, no entanto, denuncia um apagão de dados vivido pelo setor desde 2016, ano em que deixou de ser publicado pelo Ministério da Saúde o boletim eletrônico “Saúde Mental em Dados”. Disponibilizado de 2006 até 2015, o mesmo reunia informações fundamentais para o desenvolvimento de políticas públicas e também para o controle social do setor.
O relatório destacou o desfinanciamento da saúde mental, seja em proporção dos gastos da pasta da saúde, seja nos gastos federais per capita com a Política de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Em 2012, ele era de R$16,90 por pessoa e, em 2019, já havia caído para R$12,40, sempre em valores atualizados.
Foi registrada uma redução do cadastramento anual dos Centros de Atenção Psicossociais (CAPS), uma vez que se mostra necessário o cadastro pelo Ministério da Saúde para que seja possível o acesso às verbas federais. Atualmente, há a tentativa de revogar diversas portarias de saúde mental, como o fim do programa “De Volta para Casa”, projeto para a inserção social das pessoas que permaneceram em longas internações psiquiátricas incentivando a organização de uma rede ampla e diversificada de recursos assistenciais e de cuidados, facilitadora do convívio social, capaz de assegurar o bem-estar global e estimular o exercício pleno de seus direitos civis, políticos e de cidadania.
Além disso, o presidente Jair Bolsonaro tentou revogar diversas portarias da saúde mental, propondo a redução das atribuições do CAPS, o afrouxamento de controles da internação involuntária e o fim dos mecanismos de fiscalização e estímulo da redução do tamanho dos hospitais psiquiátricos, entre outros diversos processos que já estão em execução no país.
O Hospital Colônia em Barbacena
O hospital psiquiátrico recebia diariamente, além de pacientes com diagnóstico de doença mental, homossexuais, prostitutas, epiléticos, mães solteiras, meninas consideradas rebeldes, mulheres que engravidaram de seus patrões, moças que perderam a virgindade antes do casamento, mendigos, alcoólatras, melancólicos, tímidos, e diversas pessoas consideradas fora dos padrões sociais. Mais de 60 mil internos morreram devido aos tratamentos abusivos dos médicos e funcionários, e diversas pessoas foram marcadas de maneira irreversível.
Com informações do Brasil de Fato