Por Gabriel Fernandino.
I.
Na retina de mineira, o bang-bang é bucólico: é mato ou morro.
É preciso, portanto, por muito, navegar o caminho, traspassar a tal pedra no meio desse…
e por que raios (pirilampos e trovões) tanto alvoroço por uma pedra no meio do caminho,
se a estrada é feita dos tais paralelepípedos?
Nas botas mineiras, onde em se pisando tudo bate, a geografia emocional é de picos e depressões, os mares de morro e de vivo — o esquisito fiar da vida que, o quão mais longa, mais curta…
palmilhar no lombo de si é preciso, apear não!
Sou a razão de ser do caminho, dou-lhe vida e ele caminha suas pedrinhas em mim. Caminho-eu, Eu-caminho: a estrada só ganha vida se caminhante houver.
Pelo tanto, então, como dizem lá na terra, sim, bora!
Sisifar nossa pedra do meio do caminho ao cume do morro.
II.
Vencida a pequena filosofia montanhesa, olho a topografia da minha retina,
vejo que há um pé de carambola defronte, e donde o há, antes havia o araçá.
[As goiabinhas nordestinas transmutaram-se em ramalhetes vermelhis intercalados por gordas gotas amarelas e estreladas]
Se, assim, o araçá virou caramboleira é indício de que me movi no caminho, sobre certas pedras minha botas bati. Estradar e especular é preciso, entender não.
III.
A casa é nova e os sonhos da noite anterior velhos, senis, caducados como a morte. Noite estendida ao sem-limite do torpor, e os sonhos, chumbados e massacrantes.
Se tão pesados, será que sonhos foram? De quantos cascalhos o inconsciente é feito? Será que caminho, morro enquanto durmo? Vago enquanto sonho morro acima? Decerto, divago. Divagar e sempre.
Novas micro e irrelevantes filosofias. Vago-as, trespasso-as também.
Se durmo, se sonho um caminho ou uma rima, parece, não há prece, pedra ou maldição:
caminho abaixacima e morro. Onde vou, lá estou, não há fuga de mim, é tudo sim travessia de mim comigo.
IV.
Amanheço tarde, embora cedo deva ter havido cor no sol que lambeu o sonhado bang-bang de carambolas, seixos e araçás, a casa nova e todo caminho até o limite do ensolarado ocidente.
As tais pequeníssimas e colossais existências para alguém que caminhava e se doirava de sol. Eu não, eu dormia, morria, não era então coisa do mundo dos viventes, eu era, dentro de mim, pedra inerte no caminho.
Sem mais tardar, despertei enquanto o dia adormecia.
Recomecei a saltitar e empurrar meus paralelepípedos.
“Simbora! Não há hora! De todo jeito, tem jeito!”,
repetem os ímpetos do meu mineiro instinto
(ao passo que pedram cantam pelo desfiladeiro)
— Si quieres cambio verdadero, pues, camina distinto!
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